Publicou a primeira história aos quadradinhos aos 14 anos, mas começou a fazer fanzines aos oito. Simples na forma de estar, mas rigoroso até à exaustão de pormenor no trabalho que executa, é assim que encontramos José Ruy, "um duplo amador" que bem pode dizer-se em actividade há seis décadas e uma das poucas unanimidades da banda desenhada lusitana.
Nasceu na Amadora, em 9 de Maio de 1930, e aqui vive desde sempre, à excepção de um período de poucos anos que passou em Lisboa, onde estudou, em Belas Artes e na António Arroio, onde concluiu o Curso de Artes Gráficas. Tem publicados 46 álbuns de banda desenhada, sem contar com as centenhas de histórias aos quadradinhos que publicou no Papagaio, n'O Mosquito e no Cavaleiro Andante. Tem uma simplicidade do tamanho do mundo e chama-se José Ruy.
Esteve na semana passada no Faial onde ministrou o curso de ilustração sequencial, na Biblioteca Pública João José da Graça, um curso que contou com a participação de 16 formandos, sendo que o mais novo tinha apenas 11 anos de idade.
Tribuna das Ilhas conversou com este grande mestre da banda desenhada em Portugal eu nos disse estar satisfeito com a adesão, “neste curso falamos das origens da banda desenhada e das histórias em quadrinhos. A organização de arquivos, a inspiração, os balões, entre outras coisas, foi tudo abordado neste curso. Não ensinei ninguém a fazer BD, dei lhe as ferramentas, como se lhes desse a cana para irem pescar em vez de lhes dar o peixe no prato”.
Quadrinhos não quadradinhos
Histórias em quadrinhos e não em quadradinhos porque as histórias desenrolam-se em vinhetas que não são todas quadradas. A banda desenhada vem da publicação em jornais no século XIX, e nessa altura eram usadas tiras que depois as pessoas guardavam. Hoje em dia usamos uma prancha com vinhetas de várias formas.
Os brasileiros chamam ao que nós chamamos de banda desenhada, literatura em quadrinhos. Posso parecer presunçoso se disser que faço isso, mas, se transponho para a BD obras como “Os Lusíadas”, Gil Vicente, Alexandre Herculano, Fernando Mendes Pinto, sem dúvida que estamos a fazer literatura” – sublinha Mestre José Ruy.
Mestre José Ruy já viu as suas obras serem traduzidas para várias línguas, de entre as quais, hebraico. Neste caso, e como fez questão de ensinar neste curso, teve que remodelar todas a vinhetas, porque a leitura é feita da direita para a esquerda e não da esquerda para a direita como no nosso caso, “o encaixe da composição gráfica de uma página tem que ser pensado de maneira que aguente as trocas, senão tínhamos que desenhar tudo outra vez”.
O mestre José Ruy é adepto do papel e da caneta, até para as legendas dos seus trabalhos, “uso o computador para fazer powerpoints mas para desenhar não. Faço questão de fazer tudo manualmente.”
Confrontado com a questão sobre se a Banda Desenhada perde com a introdução das novas tecnologias, José Ruy diz que “não… tenho alguns colegas que trabalham muito bem com o computador, e no final da história não têm originais, têm um DVD que fornecem á oficina e automaticamente fazem as chapas e metem na máquina. Os impressores não têm nada para comparar. Fazem trabalhos bons, mas é diferente…”
Talentos no Faial
Depois de uma semana de formação, perguntamos a José Ruy se existem muitos talentos aqui no Faial, com um grande sorriso disse-nos “parece-me que sim. Esta formação foi mais um incentivo para fazerem coisas. O grupo de trabalho é muito diversificado, quer em termos etários quer no sexo, e as revelações são fantásticas. Mas é como tudo na vida… o talento para a BD não nasce com as pessoas… fabrica-se. As pessoas têm é que ter gosto e aplicar-se.”
As obras
De todas as obras já editadas, Mestre José Ruy, diz-nos que “a menina dos meus olhos é sem dúvida “Os Lusíadas”. Deu-me imenso prazer fazer esta obra, quer pela recolha da documentação necessária, pela história em si. Este livro é uma homenagem a todos aqueles que participaram nos Descobrimentos”.
O Mestre José Ruy sente o carinho do público. Continua a vender imensos livros e isso mostra a receptividade. Por exemplo, “Os Lusíadas” já está com 80 mil exemplares editados e, neste momento, está a ser ultimada uma nova edição em português e outra em mirandês.
Quando se prepara para começar numa obra, José Ruy procura ir aos locais e explorá-los, porque como diz “não conseguiria transpor para o papel o que verdadeiramente sinto se não visse, tocasse, sentisse as coisas e os lugares como eles são”.
Veio aos Açores pela primeira vez em 1987. Anos mais tarde, a convite da professora Maria Eduarda Rosa, veio até à escola básica João José de Ávila para conversar com os alunos. Daí a lançar o primeiro livro relacionado com o Faial foi um salto, falamos de “A Ilha do Futuro”. Posteriormente teve oportunidade de visitar o Peter Café Sport, e ficou apaixonado com o museu e editou um livro alusivo a isso mesmo. Um livro futurista que se passa daqui a 50 anos, quando se comemora os 100 anos do Vulcão dos Capelinhos.
O mestre José Ruy está a preparar a edição de uma obra que retrata a história da língua mirandesa e outra falando do filósofo Leonardo Coimbra.
Da blogosfera para o papel
Há 13 anos
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